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Wednesday, November 27, 2013

Humor Negro combate estresse

O que há nos seres humanos que nos faz querer rir quando deveríamos chorar?
Meu filho de 6 anos gosta de pular. Pula por toda parte. Esse hábito faz com que pareça implacavelmente alegre, apesar de os pulos terem mais a ver com o fato de ele ser portador da síndro­me de Asperger  (ou desordem de Asperger) do que com um bom humor genuíno. Às vezes acho que, quando os jacarés de 30 metros saírem dos esgotos de Nova York para devorar a população, Gus irá pulando na direção deles para cumprimentá-los, perguntando se preferem andar de trem, ônibus ou táxi. (Transporte urbano: sua obsessão atual, junto de girafas, os Beatles e pés femininos.)
Pensando bem, ter um filho autista e hiperativo não é tão engraçado assim. Mas todos os dias ele me faz rir. Às vezes me meto em enrascadas graças a uma certa falta de “solenidade” diante de suas diferenças. Em primeiro lugar, não as chamo de diferenças; digo que ele é doido. Isso nem sempre gera simpatia nas outras mães de crianças com necessidades especiais. E não é que eu não entenda a preocupação de ter um filho que não pode chutar uma bola de futebol, nem ter uma conversa complexa, nem, aliás, fechar o zíper das calças. Eu entendo. Mas, em vez de ver o nascente fetiche de Gus por pés e sair correndo atrás do psiquiatra, prefiro pensar: Na melhor das hipóteses, ele será pedicuro; na pior, terá muitos amigos nas salas de chat.

Humor Negro

Todos os dias agradeço a Deus pelo hu­mor negro. Adoto esse ponto de vista, expresso pela primeira vez por Woody Allen: “A vida é cheia de angústia, solidão e sofrimento... E acaba cedo demais.”
O que há nos seres humanos que nos faz querer rir quando, logicamente, deveríamos cho­rar? Ora, de certa forma o humor negro não deixa de ser um tipo de bravura. Katherine Russell Rich escreveu The Red Devil: To Hell with Cancer and Back (O demônio vermelho: ao inferno com o câncer, ida e volta), uma crônica engraçadíssima sobre sua batalha contra o câncer de mama metastático.
Ela pertence aos 8% que ainda estão por aqui 20 anos depois do diagnóstico de câncer em estágio IV. Acho que rir não doeu. A primeira reação dela, por exemplo, ao encontrar um nódulo na mama foi parar de fazer sexo. Criada na elite branca e conservadora, ela não sabia qual seria a reação caso alguém o percebesse. Depois que superou esse medo, Katherine acabou embarcando em um relacionamento com um psicanalista alcoólatra. Por quê? Porque ele costumava ficar tão bêbado que “não perceberia se a minha cabeça caísse”, diz ela, muito menos um nódulo no seio.
Continuando a leitura do livro, supomos que seria difícil extrair gargalhadas de vômitos e transplantes de medula óssea. Katherine consegue.
“Quanto pior fica a situação, mais acho graça; fui criada assim e assim aprendi a lidar com tudo”, diz ela. “Mas, fora isso, acho que é preciso ser engraçado para os outros não entrarem em pânico. Ou seja, é bom dizer ‘Céus, estou com câncer’ aos amigos mais íntimos. Mas não dá para fazer isso com todos; não se pode pedir ao mundo inteiro que nos dê apoio.” Para ela, o humor negro também é um dedo no olho da dor. “Com o câncer, é como dizer: pode levar meu corpo, mas não levará minha mente”, afirma.
O humor também deixa as pessoas à vontade. Nisso, Robert Reich é excelente. O ex-ministro do Trabalho de Bill Clinton mede menos de um metro e meio porque nasceu com um distúrbio que impediu seu crescimento. Há alguns anos, quando concorria ao governo de Massachusetts, nos Estados Unidos, começava os discursos dizendo: “Mandaram-me ser curto.” Ou, em pé numa escadinha, anunciava: “Sou o único candidato com uma plataforma de verdade.” A plateia ficava à vontade com sua altura porque ele estava à vontade.
Percebi recentemente que o senso de humor negro é o denominador comum das pessoas mais amorosas e respeitosas que conheço. Há alguns anos, o pai do meu amigo Spencer morreu; este ano, ele passou boa parte do tempo à cabeceira da mãe, que travou longa batalha contra uma doença cardíaca. Ele a amava profundamente, mas não faz o gênero sentimentaloide. Fanático por teatro, ele disse apenas isto no e-mail em que anunciou a morte da mãe: “Bem, finalmente posso participar do coro de Annie, aquele musical da Broadway.”

Humor contra estresse

Arnie Cann é professor de Psicologia da Universidade da Carolina do Norte e estuda a importância do humor no estresse – especificamente, como o bom humor nos ajuda a suportar situações difíceis. Ele demonstrou o que todos sabemos por instinto: rir depois de um trauma limita os piores efeitos do evento traumático.

Mas a pergunta que fazemos é: qual o tipo de humor é benéfico?

Num estudo publicado pelo International Journal of Humor Research (Revista Internacional da Pesquisa sobre o Humor), Cann usou uma escala de medição psicológica dos estilos de humor, desenvolvida pelo pesquisador canadense Rod Martin, para verificar como os diferentes tipos de graça ajudavam as pessoas a lidar com o estresse.
Dois desses estilos, os chamados “humor corrosivo” e “humor agregador”, não tiveram qualquer efeito sobre o modo como as pessoas percebiam o estresse. O humor corrosivo é exatamente isso: atacar ou implicar com os outros para provocar risadas. O humor agregador inclui piadas mais gerais sobre temas neutros: o clima, a última lista dos Dez Mais da TV, etc. Outros dois estilos – o “aprimorador” (ou “de bem com a vida”) e o “autodepreciativo” – tiveram importância.
“Pedimos que as pessoas pensassem nas experiências estressantes do mês anterior”, diz Cann. “As que tinham muito humor aprimorador simplesmente percebiam menos estresse na vida do que aquelas com estilo autodepreciativo.”
O humor autodepreciativo pode nos tornar populares. Afinal, todo mundo gosta de gente engraçada e modesta. Mas Cann explica que este tipo de humor “provocou níveis mais altos de estresse”.
Por sua vez, o humor “de bem com a vida”, a capacidade de achar graça quando tudo parece desmoronar, nos protege dos eventos estressantes. Jim McKay, ex-treinador do time de futebol americano Tampa Bay Buccaneers, é um exemplo. Durante uma temporada horrorosa, perguntaram a McKay o que achava da execução do time. Ele respondeu: “Sou a favor.”
“Os participantes que conseguiam ver o lado engraçado de algo ruim pareciam mesmo proteger-se Outro dia, não pude deixar de pensar em Cann quando uma amiga casada veio me confessar que tinha um caso. Na época, o casamento estava em ruínas, ela se sentia humilhada e não fazia ideia de como continuaria a levar a vida. Mas vi que conseguiria dar a volta por cima quando, depois de uma hora de choro, ela revelou: “Ai, perdi o homem que amo. Mas, por outro lado, posso começar uma nova carreira de consultora de motéis.”

Rir é o melhor remédio

Rir diante das frustrações é um excelente tônico também no trabalho. Quem trabalha em áreas estressantes concorda: é preciso rir, senão ninguém consegue fazer o serviço. De fato, sempre achei que, nas horas de folga, os donos de funerárias eram um pessoal extremamente alegre.
“É preciso ter senso de humor nesse ramo para lidar com todas as emoções”, diz James Olson, dono de uma funerária em Sheboygan, no Wisconsin. “Em geral, são as famílias que vêm e começam a contar piadas.”
Meu amigo Spencer concorda. No dia seguinte à morte da mãe, ele e o irmão foram marcar a cerimônia no crematório. “Sentados na sala do diretor de funerais, é claro que estávamos muito tristes”, diz ele. “Foi aí que notei o cartaz na parede: ‘Proibido acender cigarros’. Digamos que isso quebrou o gelo.”
Olson acrescenta que o riso costuma ser o outro lado do choro. “Daí vermos tanta gente rindo em funerais.”
Isso me lembra o famoso episódio da série de TV Mary Tyler Moore. Mary vai ao enterro do palhaço Risadinha, que se fantasiara de amendoim num desfile e fora descascado por um elefante faminto. Durante a oração fúnebre, Mary tem um ataque de riso nervoso depois que Risadinha é lembrado por um colega de trabalho, que cita seus vários personagens: “Peter Amendoim, Sr. Fi-fi-fô, Billy Banana e o meu predileto, a Tia Iu-hu. E o que Risadinha pedia em troca? Pouca coisa. Em suas próprias palavras, ‘um pouco mais de música, um pouco mais de dança, e alguns balões estourados como criança’.” É nesse ponto que Mary perde o controle.
É a necessidade de rir – ou, na verdade, de gargalhar – diante de coisas terríveis que nos torna humanos. Por saber disso é que o comediante Eddie Brill adentra alguns territórios delicados. Em certo momento de seu espetáculo, ele fala do calor que faz no Iraque: “Lá é tão quente que os homens-bomba se explodem só para sentir um ventinho.” A piada é de humor negro, e toda vez provoca risos.
Em momentos assustadores, tristes ou mesmo trágicos, o riso faz voltar a normalidade e a esperança.
Na semana passada, recebi o boletim do nosso filho Gus. Apesar de ler e fazer contas acima do nível da turma, ele simplesmente não consegue se entender na escola. Está atrasado em todos os aspectos sociais e comportamentais. Não faz nada com grupos de crianças, fala em voz alta e na hora errada durante a aula, faz de tudo para chamar a atenção e tem tão pouca habilidade motora aos 6 anos que mal consegue escreever o próprio nome.
Meu marido John e eu examinamos o boletim juntos, num sil&eccirc;ncio soturno. Então chegamos à Educação Física. O professor de ginástica disse que Gus estava avançado para a idade – nos saltos.
“Veja!”, disse John. “Nosso filho é superdotado.”
Rimos como bobos por algum tem­po. Mas sabe de uma coisa? Gus é nossa dádiva por muitíssimas razões, e uma das mais importantes é: ele é engraçadíssimo. Quando rimos dele, o futuro nos parece melhor. Funciona sempre.

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