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Saturday, June 21, 2014

Um líder que é o que veste

Um líder que é o que veste
Mesmo para os padrões de um mundo que viu blogs devotados ao senso de estilo de Michelle Obama, as transformações pré-eleição de François Hollande e Dilma Rousseff e a canonização das camisas de Nelson Mandela, a imagem do novo primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi – e sua explosão fashion –, é matéria para um estudo de caso.
Mesmo para os padrões de um mundo que viu blogs devotados ao senso de estilo de Michelle Obama, as transformações pré-eleição de François Hollande e Dilma Rousseff e a canonização das camisas de Nelson Mandela, a imagem do novo primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi – e sua explosão fashion –, é matéria para um estudo de caso.
De fato, mesmo para os padrões da própria Índia, onde líderes talvez sejam mais antenados e usem vestimentas como uma estratégia comunicativa (veja: a adoção do dhoti por Mohandas K. Gandhi, o casaco de Jawaharlal Nehru e os saris de Indira e Sonia Gandhi, feitos a partir da tradicional vestimenta indiana, o khadi), Modi se destaca. Literal e estrategicamente.
Afinal, ele usou o modelo com tanta frequência que a peça agora leva seu nome (o Modi Kurta, a versão revisada da clássica túnica indiana com mangas três quartos), e o alfaiate que a criou, Bipin Chauhan, da cadeia de roupas Jade Blue, registrou a marca e a está levando para a Grã-Bretanha, os Estados Unidos e o sudeste da Ásia. A roupa tem sua própria hashtag no Twitter (#ModiKurta) e há um site de e-commerce voltado ao look Modi (modimania.com), que foi criado, de acordo com declarações constantes na página, porque Modi “se tornou um estilo não apenas na Índia, mas no mundo inteiro”.
Tudo isso mostra o sucesso de Modi em associar seu estilo pessoal à sua plataforma política, para o benefício de ambos. Objetivamente dizendo, o Modi Kurta por si só não representa exatamente um extraordinário avanço estético; ele, na verdade, simboliza um conjunto de valores. E é aí que reside sua sedução.
De acordo com Priya Tanna, editora da Vogue India, “nunca antes houve uma convergência tão forte entre o que um político na Índia defende e sua forma de se vestir”. Ao menos não num passado recente, e nem por algo que claramente se destina ao público em geral (e não apenas aos obcecados com a imagem) e que é abertamente reconhecido por seu criador.
Tanna pode contar nos dedos o porquê disso. Um: a escolha de um kurta ressalta uma imagem cultural que é “100% Índia”. Dois: é uma peça democrática – qualquer pessoa pode vesti-la da mesma maneira. Três: apoia a indústria local. Quatro: diferencia Modi de seu oponente político, Rahul Gandhi, que preferiu simples camisas brancas para contrapor o status de sua família como membros da elite indiana e que também veio da tradição do estilo ocidentalizado Oxbridge. Cinco: isso, consequentemente, enfatiza as origens humildes de Modi (seu pai era vendedor de chá), embora ele não precise fingir que é humilde; ele pode personificar a mobilidade emergente. E tem mais.
Seis: o fato de o kurta de Modi estar sempre limpo e arrumado, e geralmente colorido (ele tem aparecido vestido de laranja, verde-limão e azul-claro, entre outras cores), fornece um contraste claro ao que o India Today chamou de “a era dos desleixados e barrigudos comedores de paan (políticos), com seus dhotis amarrotados e kurtas sem cor”. Isso sugere um claro comprometimento com o profissionalismo e os negócios. Sete: o fato de os kurtas de Modi serem feitos com materiais que incluem algodões e sedas orgânicos, combinado à sua nada acanhada inclinação por relógios (ele tem um Movado) e óculos de sol (Bulgari), mostra um estilo que reflete a visão que ele tem de seu país e suas indústrias. E oito: esse ponto é bastante realçado pela história de seu alfaiate, que começou costurando fora das lojas de roupa e agora possui uma cadeia de lojas, tornando-se uma celebridade graças a seu cliente famoso (que, a propósito, aprovou o registro da marca Modi Kurta).
Para aqueles que pensam que tudo isso parece exagerado, note que o look Modi começou a se desenvolver apenas quando o político trocou seu trabalho de pracharak (um tipo de atuante ou ativista político, com seu uniforme estritamente controlado) do grupo de direita Rashtriya Swayamsevak Sangh para o partido nacionalista hindu Bharatiya Janata, no fim dos anos 80 – a mesma época em que começou a visitar Chauhan por conta dos kurtas. O alfaiate falou “Modi me disse certa vez que não pode transigir de três coisas: seus olhos, sua voz e suas roupas”.
Esse tipo de admissão quanto à criação da imagem frequentemente é desconfortável para especialistas, especialmente nos países do Ocidente, em que há certo senso de impropriedade hipócrita atado ao fato de parecer ter havido um planejamento exagerado na escolha das roupas (veja: Nicolas Sarkozy, também conhecido como Presidente Bling-Bling). Isso gera um ponto fraco – e, de fato, o líder do partido oponente Samajwadi, Mulayam Singh Yadav, jogou a indireta de que Modi “troca de kurta 500 vezes por dia” durante a campanha.
Mas Modi tem sido consistente e firme a respeito de suas táticas de vestimenta, chegando ao ponto de se gabar em um comício em Gorakhpur, comentando que tinha tórax e ombros largos. A vantagem – a criação de uma comunicação visual simplificada que é amplamente reconhecida e, a se julgar pelo número de pessoas que começaram a segui-la, aprovada – vale a pena.
A questão agora é se seu estilo e mensagem irão mudar com o fato de ter assumido o poder; em sua cerimônia de posse, por exemplo, Modi trocou seu kurta com mangas curtas por uma versão de mangas compridas com botões no punho, gerando debate no Twitter sobre se o look mais formal seria um sinal positivo ou não. De qualquer modo, o que fica evidente é que ele estabeleceu firmemente a ideia de que sua forma de se vestir tem um significado que vale a pena ser analisado. Se, como acredita Tanna, Modi irá criar mais modismos à la Sonia Gandhi e seus saris de algodão (que se tornaram um look de trabalho “cool” para muitas mulheres) é, talvez, a verdadeira tendência que vale a pena ser observada.

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